Já fui só filha. Já fui só mãe. Já fui só jornalista. Já fui só dona de casa.
Já fui só aluna. Já fui só professora. Já fui só realista. Já fui só sonhadora. Já fui só triste. Já fui só empolgada.
Já fui só cheia de dúvidas. Já fui só cheia de certezas. Já fui só doida. Já fui só equilibrada. Já fui só consumista. Já fui só econômica. Já fui só sensível. Já fui só dura.
Um mundo em preto e branco. Ou é ou não é. Ou se encaixa ou não se encaixa. Ou sou uma coisa ou sou outra.
Que ousadia a minha acreditar que me enquadraria em uma única definição. Ou em definições exatas.
Aquela menina que se sentia filha, no começo da vida, permanece em mim. Continuo com os medos, os anseios de alguém que busca ter a proteção dos pais por toda a vida. Ainda que tenha me tornado mãe e aprendido a lidar com todos os desafios, dúvidas e maravilhas da maternidade.
Aquela jovem solteira que sonhava com o príncipe encantado ainda vive em mim, mesmo estando casada. Minha esperança de um final feliz habita meus sonhos, mesmo eu tendo cabelos grisalhos.
Aquela que gostava de escrever para se sentir melhor, cresceu, virou jornalista, experimentou outros empregos, e voltou ao começo: escrever para entender o mundo. Ainda assim, continua curiosa por outras profissões, novos caminhos. A minha curiosidade não mudou nem envelheceu comigo.
Sou uma e sou tantas. Tantas que, às vezes, não caibo em mim. Um lado fica mais evidente e extrapolo, dando a impressão de que sou só de um jeito.
Não sou.
Sou mãe e filha. Jornalista e dona de casa. Sonhadora e realista. Professora e aprendiz. Jornalista e leitora.
Sou uma coisa e outras, muitas outras. Não uma coisa ou outra.
O “e” adiciona. O “ou” é excludente.
Demorei décadas para entender os 50 tons de cinza do mundo. Meus 50 tons. Demorei 40 anos para entender que um único papel não me definiria. Hoje, não ter uma definição precisa de quem eu sou não me angustia. Hoje entendo que sou muitas dentro de um pessoa só. E celebro a possibilidade de viver várias vidas dentro de um só corpo.

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