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Pesquisa detecta que idosos têm pouco acesso a programação cultural em Cuiabá

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Pesquisa detecta que idosos têm pouco acesso a programação cultural em Cuiabá
Foto: Pixabay/Livre reprodução

A chegada da terceira idade poderia representar o momento de desfrutar a tão sonhada tranquilidade e liberdade a quem dedicou uma vida ao trabalho e à família para, enfim, se divertir. Mas a realidade que o produtor cultural Juciney Fernandes Sampaio, 26 anos, encontrou ao realizar um levantamento do que os idosos consomem de cultura em Cuiabá foi bem diferente.

De 100 pessoas com idades entre 60 a 88 anos, 82 nunca foram ao teatro e 85 não conhecem um museu sequer; desta centena, 73 frequentam shows e concertos, mas apenas 35 vão ao cinema.

Como trabalho de conclusão de curso da MT Escola de Teatro, Juciney – integrante da primeira turma de graduados da instituição pioneira em formação cênica no Estado – entrevistou pessoas da melhor idade que moram na capital, em espaços como praças, bairros e shoppings. Um dos questionamentos levantados por ele diz respeito à assiduidade. “Com que frequência você participa de ações culturais?”. Ao todo, 55 responderam que participam às vezes, 25 disseram que sempre e 20 nunca tiveram tal vivência.

Juciney Fernandes Sampaio

O resultado vai ao encontro das vivências do produtor durante o período de formação na escola, sediada no Cine Teatro Cuiabá. Conviver sempre com o mesmo público e ser desafiado com a temática do “etarismo”, o fez questionar onde estariam os idosos nesses espaços.

“Nos dois anos que estudei ali, percebi que os equipamentos são frequentados sempre pelas mesmas pessoas, como os próprios artistas e amigos já inseridos no meio. Se a sociedade em geral já tem todas essas dificuldades de acesso à cultura, imagina os idosos. E aqueles que moram em bairros periféricos? Nós não pensamos que essa parte da população tem suas particularidades e que precisamos nos adaptar a elas”, avalia Juciney.

Resultados

A necessidade de políticas de incentivo à cultura, integradas a outros aspectos como mobilidade urbana e democratização da informação, pesam sob os resultados gritantes que revelam o desconhecimento da população idosa sobre a existência das ações culturais da cidade e/ou a dificuldade de acessá-las.

Os resultados encontrados podem alarmar para outras faixas etárias da população.

De acordo com os dados da pesquisa, o interesse dos idosos pelas manifestações artísticas – que soma satisfatórios 90% – esbarra em empecilhos como a distância dos equipamentos (18%), os horários das apresentações (15%) e os valores dos ingressos (21%). Mas, junto a esta última, a maior dificuldade encontrada pelos idosos em relação ao acesso à cultura, é a falta de transporte adequado, 22%. Isso porque Juciney lembra que, em Cuiabá, três dos cinco teatros podem ser considerados centrais.

Preconceito (4%), segurança (5%) e limitações físicas (5%) foram as respostas de apenas 14 dos 100 entrevistados para a pergunta: “Qual a maior dificuldade ao visitar equipamentos culturais?”.

Outra questão levantada durante o estudo, cujo resultado aponta soluções, foi “O que você consome de cultura em Cuiabá?”. A música (18%), seguida da cultura popular (15%), do cinema (13%), teatro (12%) e passeios de lazer (12%), são atividades que mais se destacam entre os idosos. Livros (4%), artes visuais (3%) e museus (2%) são os menos consumidos por essa população.

A coleta dos dados, realizada entre os dias 20 e 28 de novembro de 2018, reflete um ano que começou com a maioria dos museus estaduais (sediados em Cuiabá) fechados e termina com alguns deles recém-reabertos após mais de dois anos. Segundo a Secretaria do Estado de Cultura (SEC), a Galeria Lavapés, Museu Residência dos Governadores, Museu de Arte Sacra e Museu de História Natural estão novamente abertos à população.

O papel da produção cultural

Juciney também destaca que, dentre os aprendizados que resultaram do trabalho, entender a produção cultural como um trabalho que vai além dos palcos e se volta à formação de público, é uma perspectiva que pode ajudar na elaboração de políticas públicas de cultura.

Uma vez que o horário das apresentações e a distância dos equipamentos culturais foram apontados como algumas das principais dificuldades de idosos, para ele, o produtor deve ter a sensibilidade de buscar chegar ao público, investindo em divulgação ou adaptando a própria ação à circunstâncias mais acessíveis.

A música e cultura popular serem os segmentos mais acessíveis aos idosos são resultados que também mostram caminhos. Vale ressaltar que Cuiabá é referência em festas tradicionais, tendo os quintais e comunidades como patrimônios culturais que exercem importante papel na construção da identidade do povo cuiabano. A música, por sua vez, está cada vez mais portátil diante das novas plataformas digitais.

“Com esse resultado, percebemos que há muitos campos a serem trabalhados em produção cultural na capital. A cultura deve ser desenvolvida não só nos equipamentos e espaços onde já tem o seu público formado e desenvolvido, as artes devem chegar às periferias, próximo às casas das pessoas, para obter um alcance e um resultado mais satisfatório”, conclui Juciney.

Incentivo à cultura

Cabe ao poder público e à iniciativa privada, por sua vez, investir e apoiar políticas de incentivo à cultura que possam baratear tickets e mobilizar públicos e comunidades, viabilizando o trabalho do produtor cultural. Para Juciney, a falta delas é um dos maiores desafios da profissão.

“Não adianta a gente fazer projeto para ser apresentado somente no teatro e casas de shows, precisamos levar para quem não tem acesso. Levar informação através da arte, seja num quarto, numa peça de teatro ou num show. Os números para cultura sempre foram muito pequenos, não só no âmbito local, mas no Brasil. E são leis e editais que possibilitam ao produtor cultural viabilizar esse acesso e ações espalhadas pela cidade, Estado e país”, ressalta Juciney.

Ademais, para o jovem, iniciativas que fomentam a formação de profissionais e artistas, como a MT Escola de Teatro, também são essências no esforço de democratização da arte e cultura.

“Ter uma escola de ensino superior pela primeira vez, é capaz de mudar a realidade de muitos profissionais e construir conhecimento na área. Contribui não só para formar artistas, mas técnicos e público, dando oportunidade de formação para quem talvez nunca tivesse. Em 2018, a MT Escola de Teatro entrega ao mercado 33 profissionais aptos a atuarem em várias funções, antes precisávamos sair do Estado para grandes capitais para buscar formação e hoje temos no estado um curso de qualidade e gratuito”, finaliza.

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