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Venezuelanos chegam de Roraima a Cuiabá e apostam na união para superar dificuldades

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Venezuelanos chegam de Roraima a Cuiabá e apostam na união para superar dificuldades
(Foto:Ednilson Aguiar/ O Livre)

No entra e sai de salas e dormitórios, em meio a encaminhamentos e doações que chegam, haitianos, cubanos e, especialmente os venezuelanos, estavam produzidos no fim da manhã dessa terça-feira (24). As mulheres optaram pelo batom colorido e os cabelos modelados ao creme. Uma pergunta que não calava: ¿llegaron?

Já é horário do almoço e os mantimentos vão ao fogo na cozinha da Pastoral do Migrante, no bairro Carumbé, em Cuiabá. Desta vez, mais água no feijão para alimentar os 24 hermanos que estavam para chegar às 10h45 deste dia 24, preenchendo todas as 100 vagas do abrigo.

Uma garota de cabelos cacheados exibia os cílios azuis e a boca pintada de violeta, perambulando pelo abrigo com ansiedade. “Tá esperando a família”, revelou Eliana Vitaliano, que é quem comanda tudo por ali.

Yalianny Ponce, 13 anos, contava as horas para a chegada dos primos, especialmente o menor. Está em Cuiabá há dois meses e esperava também a tia e a esposa do primo. Antes dela, acompanhada dos pais, veio a irmã que está grávida.

“Boa Vista estava muito ruim. No refúgio estava bem, mas não se conseguia emprego”, conta a moça. Na capital de Roraima, de onde vieram os 24 venezuelanos, a família ficou durante oito meses, abrigada no refúgio São Vicente.

Melhormente hospedados do que alguns conterrâneos, cerca de 600, que precisaram acampar na Praça Simón Bolívar, cercada por tapumes da prefeitura, onde se controlava entrada e saída. “Na Venezuela não se conseguia emprego, escassez de alimento, então meu pai foi para Boa Vista tentar trabalhar”, explica a jovem, sobre o processo de imigração.

(Foto:Ednilson Aguiar/ O Livre)

Na contramão da realidade de fome em sua terra natal, quando crescer Yalianny quer ser uma Chef de Cozinha. “Me gusta cozinhar desde pequena”. Pegou gosto pela gastronomia repetindo as receitas dos programas de culinária que acompanha na televisão.

Antes de virem ao Brasil, a mãe foi funcionária de um supermercado e o pai foi aposentado por idade, aos 55. Trabalhava perfurando Petróleo, a grande riqueza daquela terra visada. Questionada sobre as mudanças que quer para a Venezuela, ela logo crava: “Eu quero que não tenhamos mais fome. O presidente… mal!”, responde, com gesto negativo.

Para alcançar os sonhos, a jovem está estudando no 7ª ano matutino na Escola Municipal José Luís Borges Garcia e conta que já fez muitos amigos cuiabanos. Seu grande objetivo é montar seu próprio restaurante onde todos da família trabalharão juntos, aqui mesmo no Brasil.

“Em um primeiro momento, eu pretendo ficar por aqui; depois, com o tempo, quero voltar a Venezuela para buscar minha outra família, meus irmãos”, afirma, decidida. Yalinny é a caçula de 13 irmãos, entre 17 e 31 anos, de diferentes relacionamentos dos pais. Interrompemos nossa entrevista, pois foi chamada pelos pais para comer.

(Foto:Ednilson Aguiar/ O Livre)

A chegada

Minutos depois, às 12h20, todos se aglomeraram na porta para enfim receber amigos, parentes e vizinhos desconhecidos. As crianças filmavam a reação de Yalinny com um smartphone. Do portão, metros à frente, vinham em bando como fiéis chegando à terra prometida.

Os recém-chegados são personagens de uma nova etapa do processo de interiorização, uma iniciativa criada para ajudar venezuelanos em situação de extrema vulnerabilidade a encontrar melhores condições de vida em outros estados brasileiros.

Nessa terça-feira foram 131 transferidos de Boa Vista (RR) para Cuiabá (24), Brasília (50), São Paulo (21) e Rio de Janeiro (36). Segundo dados nas Nações Unidas no Brasil (ONUBr), entre abril e julho 690 venezuelanos foram levados para outras cidades e, desses, 95 para Cuiabá.

A chegada dos 24 venezuelanos na capital completa as 100 vagas na Pastoral do Migrante, que abriga imigrantes vindos pelo projeto de integração e demanda espontânea, de ônibus e até bicicleta. A iniciativa é mantida em parceria com o município desde a década de 80.

“Graças a Deus a gente tem conseguido. Da primeira e segunda turma dos que chegaram, em torno de 80% do que chegaram já saíram da casa e estão no mercado de trabalho. Se a gente tem vaga, vamos colocando; se não, buscamos a associação dos haitianos, a paróquia do vizinho, sempre um ajudando o outro”, afirma Eliana.

(Foto:Ednilson Aguiar/ O Livre)

Assim como outros que chegaram e partiram após conquistada a autonomia, Yalinny, que logo se espalhou pela Pastoral mostrando os cômodos da nova morada ao primo, conta que o plano agora é reunir a família e buscar emprego para poderem alugar uma casa onde vão morar juntos. Mas com a leveza de criança, deixou a preocupação um pouco de lado e levou o primo para almoçar, sem dar muita bola para os jornalistas.

Apenas o cunhado da jovem está empregado e a mãe não pode trabalhar, devido a um acidente e seguida cirurgia na mão. Todos os outros buscam emprego. Mas diante da dura nova etapa, para alegria da família, além do reencontro os venezuelanos devem ser agraciados com uma cuiabaninha. A irmã de Yalinny deve dar à luz uma menina ainda nesta semana.

A propósito, Eliana lembra que a Pastoral continua recebendo ajuda da população que vem respondendo positivamente aos pedidos da comunidade. Interessados em contribuir podem entrar em contato pelo (65) 3641-1451. A Pastoral do Migrante está localizada na Av. Gonçalo Antunes de Barros, 2.785.

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