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Caminhoneiros de MT divergem sobre jornada de trabalho

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Caminhoneiros de MT divergem sobre jornada de trabalho

Gabriele Schimanoski/O LIVRE

Pedágio

 

Nos dias em que pega estrada, Marcos José Lira, 39 anos, levanta às 5 horas da manhã. Faz um alongamento, inspeciona rapidamente o caminhão por dentro e por fora e se prepara para mais uma longa jornada de trabalho. Toma assento, dá a partida e, ao longo das horas seguintes, volta a atenção ao trajeto.

Acelera, freia, desvia dos buracos, faz as curvas. Com pausas só para comer ou abastecer, o caminheiro vai vendo o tempo passar até que chegam as 22 horas. No dia seguinte, começar tudo de novo.

“Em um mês, passo em média 20 dias na estrada. Até hoje, não desenvolvi nenhuma problema de saúde, acho”, afirma Marcos, caminheiro há 17 anos.

“O caminhoneiro precisa de autonomia para gerenciar sobre a sua própria viagem, se para mais cedo, ou mais tarde,
por exemplo”

Ele é autônomo atualmente – como 60% dos trabalhadores da área do país, conforme a Confederação Nacional do Transporte (CNT) – e responsável pelo transporte de grãos pelas regiões Centro-Oeste e Sul do país.

Jornada excessiva

Na categoria de profissionais em que Marcos se insere, ultrapassar 12 horas de trabalho em um dia é uma realidade comum.

Para combater isso, a Justiça do Trabalho acolheu a um pedido do Ministério Público do Trabalho em Rondonópolis e determinou que uma federação de trabalhadores, um sindicato patronal e três sindicados laborais, com abrangência em 50 municípios de Mato Grosso, fiquem proibidos de celebrar convenções ou acordos coletivos que permitam a prorrogação da jornada dos caminhoneiros em até quatro horas por dia.

Na decisão, o juiz Ulisses de Miranda Taveira observa que permitir jornadas de 10 a 12 horas de trabalho por dia viola a Constituição Federal, já que a ocorrência dessa prática deve ser excepcional, ou seja, “em caso de necessidade imperiosa, força maior ou para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto”.

O magistrado pontuou ainda que a situação “provoca enorme dano social, uma vez que o motorista cansado, trabalhando por dias seguidos em jornada de 12 horas ou mais, se envolve com mais facilidade em acidentes de trânsito”. Ele fixou multa em R$ 100 mil por dia, no caso de desumprimento da decisão.

Desconfiança

A medida, contudo, é vista com desconfiança por alguns profissionais. Caminhoneiro há 45 anos, Rubens Branco, 61 anos, já conheceu quase todos os Estados do país “faltando apenas Rondônia e Macapá”.

Juiz fixou limite para jornadas de caminhoneiros,
frisando o risco de acidentes 

Para ele, a decisão vai de encontro a um princípio básico dos trabalhadores da categoria. 

“Quem está na profissão, gosta de dirigir e gosta de liberdade. Quando se estabelece horários, se restinge a liberdade”, afirma.

“O caminhoneiro precisa de autonomia para gerenciar sobre a sua própria viagem, se para mais cedo, ou mais tarde, por exemplo. Quando isso não acontece, não dá certo”, opinou.

Ele acredita que a decisão “não vai pegar”, uma vez que “o caminhoneiro já está acostumado a dirigir muitas horas por dia”.

Rubens dirige por volta de dez a 12 horas por dia, o que resulta, em média, em 700 quilômetros. Para ele, o maior problema não está na carga horária e sim na negociação relacionada ao valor do frete.

“O que se vê hoje em dia é a lei da oferta e da procura. Como há muitos profissionais, o preço do frete vai lá para baixo. É complicado”.

No início do ano, as principais rodovias federais que cortam Mato Grosso foram bloqueadas por caminhoneiros em protesto pela implantação de uma tabela mínima para o frete e de um aumento de ao menos 15% no valor recebido atualmente.

O frete entre Rondonópolis, importante polo logístico do setor agrícola do Estado, até o porto de Paranaguá (PR) está estimado em R$ 230 por tonelada, R$ 10 a menos do que em relação ao ano passado.

“Toda essa situação gera uma série de problemas, que vão desde gastos desnecessários com remédios até acidentes”

Caminhoneiro há 21 anos, Nélio de Mirando Castro, 57, diverge de Rubens em relação à jornada de trabalho.

Ele diz que não foram raras às vezes que presenciou acidentes em razão de colegas que estavam cansados ou sob o efeito do rebite, tipo de anfetamina para tirar o sono.

“Muitos já encaram como natural o fato de se acumular mais de 10 horas de direção por dia, o que não é”, disse.

Funcionário de uma transportadora, ele tem a carteira assinada e recebe horas extras quando as oito horas diárias são extrapoladas. Admitiu, contudo, que, o caso dos caminhoneiros autônomos deveria ser visto com mais atenção.

“Toda essa situação gera uma série de problemas, que vão desde gastos desnecessários com remédios até acidentes. Muitas pessoas dependem dos caminhoneiros, uma categoria que está muito desvalorizada, mas merece carinho e valor”.

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