Casa sem muro de entrada, portão baixo, cadeirões na varanda e horta iluminada, que, durante a noite, dá à luz as garrafais: Arado. Enchendo os olhos de quem passa na Avenida Filinto Muller, na altura do bairro Popular, a fachada deixa a dúvida sobre o que se trata. Mas a visão do corredor lateral revela um pouco do movimento no quintal.

A residência de um casal de idosos, já falecidos, deu lugar a um restaurante multifuncional, o Arado Natural. Empório, café-bar e futuramente, centro cultural. Três sabores de pizzas, lanches e saladas, caldo do dia, cinco tipos de sucos, chás de insumos da horta e combinações de ervas, café e kombucha (bebida saborizada a partir do chá preto fermentado).

Sete opções de drinks com álcool e sem álcool – de cachaça orgânica ou gim orgânico –, carta com 15 rótulos de vinhos, cervejas artesanais da marca regional Cuyabana e Louvada e a Stein Haous, primeira brasileira 100% orgânica e sustentável.

Tudo isso em uma casa reformulada, de estrutura reaproveitada, aderindo a um comportamento sustentável. Adentrando aos fundos pelo corredor, há um empório de produtos orgânicos e artesanais que podem ser consumidos nas mesas dispostas em um jardim charmoso.

“Atendemos em toda parte aberta, não estamos fechados em uma caixinha como a maioria dos restaurantes”, descreve a sócia-proprietária Silvia Trevisan. Atualmente com funcionamento noturno, a ideia é, em breve, abrir para o almoço.

Fora do convencional, da arquitetura ao cardápio, um dos primeiros desafios do negócio de Silvia Trevisan, Nayara Mohr e Marcelo Fraga foi justamente a climatização. Para proporcionar alimentação saudável em espaço agradável, dado o calor de Cuiabá, foi adotada a opção de resfriamento pelos telhados.

Além disso, os cinco alvarás, cisterna e biodigestor. Este último recurso, desde 2016, uma exigência pouco praticada pela maioria dos restaurantes, explica Silvia, bióloga e tecnóloga de alimentos. “Não forma esgoto e lança água limpa para tratamento”.

Até então atuando na área da Educação, Silvia, natural do interior de São Paulo, se mudou para Cuiabá há um ano e meio para dar início ao projeto com os parceiros, ao mesmo tempo que adotou nova dieta alimentar. Já o advogado Marcelo e a designer de interiores Nayara já vivem por aqui há um bom tempo. É esta última quem hoje está à frente da cozinha, responsável pelo cardápio e a finalização dos pratos, assumindo o papel de Chef, junto à equipe.

“O Arado é um mix do que nós acreditamos, não um produto para se vender, embora ele se venda. Tem mais a ver com nossos sonhos e ideais. Com essa virada em nossas vidas de passar apensa ‘o que podemos proporcionar para o mundo a nossa volta?’”, conta Silvia.

Buscando alternativas sustentáveis, só se utiliza produtos biodegradáveis no Arado Natural. Canudo e copos descartáveis estão fora de cogitação, estimulando a reutilização do vidro. “Se você quer levar um suco para casa, você vai levar no vidro. Esse vidro tem um custo, porque ele vai limpo e esterilizado para casa, mas, quando retornar com ele, vai ter um desconto na conta e abater o valor investido”, explica.

Na horta que recebe na varanda e acolhe no quintal, mais de 60 espécies, além das Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC’s), comestíveis e utilizadas nas preparações. “Usamos todos os insumos? Não, porque precisamos de uma quantidade maior, mas as finalizações, os detalhes sim. O capim santo, por exemplo, que vai no nosso suco é da horta, porque é suficiente. Sempre respeitando o tempo de desenvolvimento da planta”, complementa.

Gastronomia inclusiva

Além de insumos cultivados no local para compor o time de ingredientes, o restaurante não utiliza carne animal em suas receitas, rejeitando o que chamam de “especismo”, buscando enxergar a mesma importância da espécie humana e outras espécies.

Mas a opção não vem só da concepção ideológica, vem também da demanda pela gastronomia inclusiva. “Uma preocupação com as pessoas que tem restrições, seja por alergia ou intolerâncias diversas. As mais comuns são lactose e glúten, mas a gente tem cliente que tem alergia a pólen”, conta Silvia.

Todas as pizzas têm opção de massa com ou sem glúten. A com glúten, por sua vez, é sempre integral. São três sabores que custam em média R$ 40 o tamanho pequeno: Esotérico, que vai queijo gorgonzola com lascas de abóbora cabotiã assada; Oriente, de muçarela de búfala e cogumelos frescos; e Top Top, uma combinação muçarela de búfala, tomate e molho pesto.

Junto com as pizzas, o carro-chefe da casa é o lanche Divino Maravilhoso. Burguer de feijão preto, cogumelo shitake e quinoa, coberto com muçarela de búfala, pasta agridoce de tomate e gengibre, chips de coco, servido no pão artesanal. Por R$ 33, acompanha maionese caseira do Arado.

Grande parte dos ingredientes, como queijos das pizzas e os iogurtes também atendem à dieta vegana, sem derivados de animal. “A ideia é o alimento funcional e não alimento por alimento”, o que leva dá a fama de restaurante vegano/vegetariano. Nada que seja um bicho de sete cabeças, explica Silvia.

“A gente não quer rótulo de restaurante vegetariano, a gente quer inovar. A ideia do Arado é que as pessoas se surpreendam com as possibilidades. Não é substituir a carne para parecer a carne, mas mostrar combinações desse universo, aí entra o olhar da nossa sócia e chef”.

Nessa lógica, é homus de beterraba, transgredindo o lugar do tradicional do grão de bico, babaganuche, geralmente feito de berinjela, de jiló. “Todo mundo que comia falava ‘mas isso aqui é jiló, mas eu nunca gostei de jiló’”, se diverte Silvia. No Arado, ela garante que se experimentar, gosta, sim.

Cozinha experimental que desde a abertura já mudou e está mudando, seja pela criatividade ou pelas circunstancias da sazonalidade. O que também exige uma comunicação com o público diferenciada. “Aqui nossos clientes são clientes vistos. Quando há algum anseio, a gente ouve e tenta realizar. Já tivemos cliente que queria pizza sem massa e gente formulou outro tipo de massa para ela poder experimentar”.

Estímulo à produção orgânica e regional 

“Não tem nada industrializado na nossa cozinha, nada de caixinha”, afirma a sócio proprietária. Para isso, a ideia é buscar produções familiares, fornecedores regionais, estimulando o mercado local e evitando os longos transportes da lógica da cadeia industrial tanto nos produtos utilizados na cozinha como revendidos no empório.

“Somos um restaurante natural e orgânico, não só orgânico, porque nem tudo é certificado”. Os produtos do empório a maioria têm certificação, mas os que vão para cozinha a gente busca conhecer, porque não tem como a gente dizer que tem o conceito se nossos fornecedores não têm”.

A mozarela e o doce de leite de búfala, recorrente no cardápio de pizzas e sobremesas, por exemplo, são do seu Joaquim, do município de Jangada. A coalhada de cabra também é de produção local e a pasta de amendoim da fornecedora daqui, Bendito Amendoim. Fontes artesanais que não são necessariamente únicas. “Estamos sempre abertos a novidade. Temos os que já fazem parte dos nossos contatos, mas adoramos conhecer o novo e tem muito caminho e tem demanda”.

A busca pelo estímulo à regionalidade também se ramifica a outros aspectos culturais. Para um breve futuro, o objetivo é abraçar a produção cultural e artistas locais, com programações diferenciadas e espaço para exposição e comercialização de trabalhos. Além do empório e do restaurante, o paisagista e permacultor Pedro Sales já disponibiliza para venda vasos e kokedamas que decoram o local.

“A gente quer ter mais movimento de arte por aqui. Somos um espaço multifuncional, não só um restaurante, também queremos fomentar cultura”.

O Arado Natural está localizado na Avenida Sen. Filinto Müller, 284, Popular. Horário de funcionamento: Segunda a quinta-feira, das 18h30 às 22h. Sexta-feira e sábado, das 18h30 às 23h. Mais informações pelo (65) 99205-4583 ou FACEBOOK e INSTAGRAM.

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